sábado, 3 de novembro de 2007

“O mundo lá fora”


“O mundo lá fora”

Que porra é essa de professor que diz que, tem que preparar a criança para “o mundo lá fora” e repete em suas aulas o mesmo tipo de barbárie(tomadas as devidas proporções e implicações) que encontramos em nossa sociedade cruel.

Será que é esse o papel do professor fazer com os que nossos menin@s estejam preparados para o combate. Combate sim! Pois numa terra onde ensinamos a nos digladiar é porque estamos em guerra.

Que porra de cidadão é esse que diz, prega, usa do esporte, do jogo, da brincadeira para moldar uma sociedade que banaliza os conflitos, que promete mundos e fundos aquele que se esforçar e passar por cima de alguém assim conseguindo algo na vida. Que algo é esse?

Do que adianta um professor que apenas reproduz a fórmula de bolo, que se preocupa apenas com o rendimento e condicionamento físico de seu aluno. Para que precisamos de pessoas assim ensinando nossos alunos, filhos, amigos? Acho que as empresas, órgãos, sei lá... não precisam de alguém dito especialista/formado para orientar a formação ou o treinamento de pequenos soldadinhos do sistema.

Se é para preparar para “o mundo lá fora” qualquer um dá conta, afinal de contas esse tal “mundo lá fora” é o mesmo mundo que a criança, seu irmão, pai, avô... vivem. Nossa realidade não esta distante do campo ou quadra, ela se manifesta a todo o tempo nesses espaços, e o professor picareta, preguiçoso ou apenas ignorante, se acha no direito de reproduzir a lógica excludente reforçando e estimulando a individualidade, preconceito, discriminação, com o lema de formar pessoas preparadas para “o mundo lá fora”.

Essa é uma forma de extermínio, ou forma de aprimoramento forçado da raça humana. Onde o menino desde cedo é estimulado para até nos seus momentos de lazer é a superar/sobrepujar o outro, talvez a moda de novelas, seriados, filmes e desenhos com pessoas com super-poderes entrou no inconsciente coletivo como um modelo de sociedade viável e possível onde os fortes sobrevivem e os fracos sucumbem.

Sei que existem hoje em nossa sociedade maioria de ditos fracos que trabalham dia-a-dia buscando ser o mais forte, e isso se apresenta em todas as relações, desde aquele que joga mais e se acha no direito de selecionar seus pares, àquele que por ter maior porte físico oprime os mais fracos extorque aquele não pode se proteger.

Sei que estamos formando hoje, como nunca um número grande de professores e profissionais com nível superior, porém esse exercito de reprodutores do senso-comum-diplomático, que pautam seu trabalho no puro marketing pessoal que independente da qualidade do trabalho realizado, daqueles que são diretamente beneficiados ou prejudicados, fôda-se “o que eu quero é, sossego!”.

O cara chega pra mim e fala “porra você quer que ninguém mais compita, que abandonemos a competição, isso é balela, não adianta “no mundo lá fora” é assim”. Que porra é essa de mundo que é lá fora e não é aqui na minha aula. Isso não existe, creio que não precisamos abolir a competição pelo contrário devemos vivência-la de forma diferente dando a oportunidade para que todos entendam todas as implicações de seus atos e interpretem o quanto reproduzimos valores que são/estão sendo impregnados ao longo dos anos como referência, onde a violência em suas diversas manifestações (física, preconceito, opressão, segregação...) é banalizada e só vem a tona como pauta importante quando uma situação crítica ocorre (menino violenta outro menino no banheiro da escola, filho bate em mãe e mata avó, jogador quebra a perna do outro por traz ...), e ai tratamos com fatos isolados, que são fruto de distúrbios e abafamos sem darmos a real importância aos atos que praticamos todos os dias, estimulando, banalizando e se divertindo com violência gratuita em nossas, aulas, sacaneando o gordinho, deixando as meninas de lado...

Julgar incapazes é uma grande tarefa do professor atual, o cara que diz ser impossível alguém que tenha dois anos a mais respeitar aquele que é menor, que esse menor é incapaz de jogar e brincar com o maior pois instintivamente/naturalmente o mais velho irá machucar, sobrepujar, ignorar, desprezar o menor. Será que o jogo ou qualquer outra situação agradável só é considerada assim quando temos que passar por cima do outro, será que se não temos o desafio de esmagar o outro, não é estimulante, divertido, ou não leva a superação?

Sei que muitos daqueles que mais detesto por reforçarem a prática de uma educação física apenas muscular, energética e acéfala contribuem para a manutenção e ampliação dessa sociedade ou melhor dessa guerra em que vivemos.

Falar do corpo, nutrição, saúde, meio-ambiente, sem considerar o modo de produção vigente e suas implicações a vida humana é no mínimo ignorância, e numa escala planetária suicídio. Mascarar os sintomas da degradação da sociedade com novas técnicas, ferramentas e mecanismos de controle sem que mudemos a forma de organização de nossa sociedade é comédia pastelão.

Na educação física parte de nossas cabeças pensantes e seu exército de discípulos (seguidores avessos a pensamentos próprios), apresentam como único modelo possível e viável o estudo e aprimoramento dos meios, métodos e técnicas de treinamento e obtenção de resultados ligados a superação de limites do corpo, obtenção da saúde e corpo perfeito. Como podemos ser perfeitos num mundo onde pessoas passam fome em nossa porta. Como podemos buscar a superação de marcas, segundos, troféus se ao final de todo esforço a maioria em nosso país vive ali, a 3 a 4 horas das áreas desenvolvidas sem quadras, parques, opções de lazer e cultura dignas, sem saneamento, alimentação adequada e indicada pela tal OMS.

A mudança de nossa sociedade perpassa todos os momentos de nossas vidas e se ser professor é para ajudar a formar cidadãos do futuro de pessoas melhores e com hábitos mais saudáveis temos que encarar de frente e entender o porque das mazelas de nossa sociedade e não reproduzir ou melhor vender uma falsa possibilidade de sucesso obtida apenas com o esforço pessoal e as custas do prejuízo de muitos.

Deixo aqui um pouco de minha indignação e de minha motivação que não se abaterá apesar das dificuldades e barreiras a serem superadas.



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